Liberdade, Liberdade é uma peça teatral escrita em 1965 por Millôr Fernandes e Flávio Rangel, que se consolidou como um marco na história do teatro político brasileiro. Com estrutura fragmentada e tom abertamente crítico, a obra é um grito contra a opressão, a censura e o autoritarismo, surgindo em um dos momentos mais tensos da vida política do país, logo após o golpe militar de 1964.
A peça não possui uma narrativa linear tradicional. Em vez disso, é construída a partir de colagens de textos históricos, filosóficos, literários e jornalísticos, entremeados por cenas dramáticas e cômicas que abordam o tema da liberdade em diversas épocas e contextos. São incluídos trechos de figuras como Sócrates, Jesus Cristo, Tiradentes, Rousseau, Voltaire, Gandhi e outros, que ajudam a compor um painel multifacetado da luta humana contra todo tipo de tirania.
O texto é altamente simbólico e carrega um sentido de urgência: trata-se de uma denúncia da repressão e, ao mesmo tempo, de um tributo à resistência individual e coletiva. Millôr e Rangel empregam o humor ácido e a inteligência crítica como ferramentas de confronto. O uso da ironia, da intertextualidade e da quebra da quarta parede serve para provocar, envolver e instigar o espectador, fazendo-o cúmplice da reflexão.
Encenada originalmente com Paulo Autran e Tereza Rachel, sob direção de Flávio Rangel, a peça foi recebida como um ato de coragem. Em plena ditadura militar, Liberdade, Liberdade ousou colocar em cena temas como tortura, censura, conformismo e a hipocrisia dos discursos oficiais. E, mesmo com seu conteúdo frontalmente político, a obra não abre mão do lirismo, da emoção e da força poética.
O título é um manifesto em si — e a peça funciona como uma convocação à consciência crítica. A liberdade aqui não é retratada como um conceito abstrato ou idealizado, mas como uma construção concreta, frágil, que exige vigilância, coragem e ação. Por isso, o texto mantém uma impressionante atualidade: em tempos de crises democráticas e ameaças autoritárias, ele continua pulsando com vigor.
Em suma, Liberdade, Liberdade é mais do que um espetáculo teatral: é uma peça de resistência, um documento artístico-político que transcende seu tempo. Millôr Fernandes e Flávio Rangel criaram uma obra que desafia, com inteligência e ousadia, os limites impostos pelo medo e pela opressão. Um clássico necessário, ainda hoje capaz de emocionar, incomodar e mobilizar.