“Paixão Turca” (La Pasión Turca), dirigido por Vicente Aranda em 1994 e inspirado no romance de Antonio Gala, mergulha na obsessão de uma mulher pela paixão avassaladora que ela encontra na figura enigmática de Yaman, um turco sedutor interpretado por Jorge Sanz. Ana Torrent dá vida a Desideria “Desi” Oliván, uma espanhola de classe média que deixa para trás a rotina confortável de seu casamento monótono com Rodrigo (Carmelo Gómez) ao se render ao magnetismo exótico de Yaman durante férias em Istambul.
Desde o primeiro encontro, Aranda estrutura cada cena como um jogo de contraste visual e emocional: o enquadramento frio e meticuloso da vida burguesa de Desi na Espanha cede lugar a cores intensas, luzes quentes e enquadramentos apertados que comunicam a pulsão apaixonada entre ela e Yaman. A trilha sonora, repleta de texturas orientais e batidas dramáticas, reforça a sensação de deslocamento e imprevisibilidade que permeia o relacionamento.
O roteiro segue um arco trágico e quase grego: ao se lançar de corpo e alma nesse amor proibido, Desi rompe laços afetivos, arrisca sua segurança e mergulha em um universo dominado por regras culturais desconhecidas. Seu êxtase inicial dá lugar ao desconforto, ao ciúme e ao controle possessivo de Yaman — que, embora nunca explicite completamente suas motivações, deixa claro que sua paixão também é de natureza dominadora. A câmera de Aranda, muitas vezes, aproxima-se de Desi em closes sufocantes, como que prendendo o espectador na progressiva espiral de sua perdição.
Ana Torrent, então com cerca de 30 anos, transmite com intensidade a transformação de Desi: do sorriso tímido de quem se sente finalmente viva, até o olhar vazio de quem percebe, tarde demais, os riscos de ter trocado tudo por um amor que não admite limites. Jorge Sanz equilibra charme e algo ameaçador, compondo um personagem cuja atração se mistura a um poder hipnótico que desafia a autonomia de Desi.
“Paixão Turca” é também um filme sobre choque cultural e as fronteiras invisíveis do desejo. A má tradução de costumes, os jogos de poder entre homem e mulher e a idealização do “exótico” são questionados ao longo da trama, revelando como o fascínio pode se transformar em armadilha. A direção de arte acentua isso ao misturar cenários luxuosos com espaços claustrofóbicos, simbolizando tanto a sedução quanto o aprisionamento emocional.
Embora alguns diálogos soem excessivamente melodramáticos e certos momentos se estendam além do necessário, o impacto emocional permanece forte. Aranda não hesita em explorar a dimensão erótica do romance — o que, na época, causou controvérsia —, mas é no drama íntimo de Desi que reside o cerne do filme. Seu desfecho, trágico e inevitável, reforça a impressão de fábula moderna: um conto de advertência sobre os perigos de entregar-se completamente a um sentimento que não se pode controlar.
Em suma, “Paixão Turca” é uma obra marcada pela ousadia emocional e visual de Vicente Aranda. Ao contar a história de uma paixão sem freios, o filme questiona quais são os verdadeiros limites do amor e até que ponto a busca pelo êxtase pode levar à própria ruína. Uma experiência cinematográfica intensa, que mistura exotismo, sedução e tragédia num só fôlego.
